Filosofia Circular

quarta-feira, 6 de março de 2013

A filosofia do pessimismo



 O pessimismo pressupõe uma desesperança no futuro, uma previsão ruim daquilo que sobrevirá, ou, como encontrado nos melhores dicionários de nossa língua, "uma tendência para encarar as coisas pelo lado negativo". Mas o que dizer destas palavras: "A história nos mostra a vida dos povos, e nada encontra a não ser guerras e rebeliões para nos relatar; os anos de paz nos parecem apenas curtas pausas, entreatos, uma vez aqui e ali, e de igual maneira a vida do indivíduo é uma luta contínua, porém não somente metafórica, com a necessidade ou o tédio, mas também realmente com outros. Por toda parte ele encontra opositor, vive em constante luta e morre de armas em punho"? O que temos aí: extremo pessimismo ou puro realismo? Quem dentre nós poderá ser tão otimista ao ponto de negar a realidade que perpassa a história da humanidade e que pode ser encontrada, sem grandes dificuldades, em qualquer cena urbana ou privada, veiculada pelos meios da comunicação ou testemunhada na porta de nossas casas?
O nome Schopenhauer tornou-se quase sinônimo de "pessimismo" ao longo da história da filosofia. A tendência didática de rotular ou categorizar pensadores e correntes de pensamento estigmatizou um filósofo que teve como único e máximo pecado ser honesto para com sua filosofia, que concebe a vida, assim com todos os eventos da existência, como expressões diferentes da Vontade - uma força que apenas quer existir, se evidenciar num mundo que não passa de sua representação. Os quase dois séculos que nos separam de Arthur Schopenhauer, entretanto, talvez ainda não se constituam um obstáculo para uma defesa justa de suas ideias e para o vislumbramento de aspectos extremamente positivos de sua filosofia.
Zeitgeist Expressão alemã que significa, em tradução aproximada, "espírito da época". O termo é bastante utilizado por ensaístas, sociólogos, historiadores e críticos de arte para descrever a época em que uma determinada obra artística ou movimento intelectual foi produzido. A banda de rock americana The Smashing Pumpkins lançou em 2007 um álbum intitulado Zeitgeist.

A época em que Schopenhauer viveu, na Europa do final do século 18 e início do século 19, tem algumas características peculiares, que podem muito bem dizer do Zeitgeist
de então. Will Durant, em seu A história da filosofia, tenta encontrar razões para uma espécie de pessimismo comum àquele período. Diz ele: "Por que será que a primeira metade do século 19 levantou, como vozes da época, um grupo de poetas pessimistas - Byron na Inglaterra, De Musset na França, Heine na Alemanha, Leopardi na Itália [...] e, acima de tudo, um filósofo profundamente pessimista, Arthur Schopenhauer?", e acrescenta como resposta: "[...] Era bem difícil acreditar que um planeta tão lamentável quanto aquele que os homens viam em 1818 estivesse seguro nas mãos de um Deus inteligente e benevolente. Mefistófeles havia triunfado e todos os Faustos estavam desesperados". Durant também é loquaz ao dizer que "o pessimismo é o dia seguinte do otimismo".
  

















Todo homem, ilustre ou não, é fruto de seu tempo, e também vê o mundo à sua volta como a representação de si mesmo, assim como sentenciado por um antigo filósofo grego: "O homem é a medida de todas as coisas". Schopenhauer vê as coisas do seu tempo, mas, acima de tudo, abrange com seu olhar filosófico, quiçá com sua intuição (como talvez ele próprio preferisse dizer), o passado (constituído de suas incursões pelas escrituras hindus e budistas), o presente (imposto a ele frente a frente) e o futuro (projetado por sua invejável capacidade intelectual). Assim, sua filosofia traz, evidentemente, a sabedoria oriental, que inspira aqueles que buscam respostas para seu sofrimento nos ensinamentos religiosos; a compreensão do aqui-agora existencial, que une todos os povos e todos os indivíduos como uma única nação de aflitos; e a visão profética, que, relendo os eventos da vida, vaticina para todos, sem exceção, uma espécie de eterno retorno - um retorno ao nada existencial, como último consolo à existência sofrida.
Arthur Schopenhauer teve como pai, Heinrich Schopenhauer, um rico comerciante que, além de ser um homem rígido, era um marido rude, e que tem ainda contra si a forte suspeita de ter cometido suicídio atirando-se no canal de Hamburgo. A mãe, Johanna Troisener, era uma romântica, oprimida pelo marido, que só conheceu o bom da vida após a morte dele. Apesar do pai ter feito tudo para que o jovem Arthur se interessasse pelos negócios da família, não viveu o suficiente para decepcionar-se com o filho filósofo, enquanto a relação deste com a mãe foi uma das piores. Schopenhauer viveu grande parte de sua vida viajando pela Europa à custa do dinheiro herdado do pai. Foi um solitário, tinha um cachorro, ao qual deu o nome de Atman (termo hindu para alma), e pouquíssimos amigos. Para si mesmo, considerava sua vida como a ideal - a relação com os humanos não era nada fácil, portanto, preferia a solidão. No entanto, essa vida reclusa é rotulada por alguns autores como "uma vida infeliz", o que fornece um ótimo ingrediente para fomentar a denominação que darão a ele de "filósofo do pessimismo". Sua obraprima, O mundo como vontade e representação (1819), só conquistou leitores após sua morte, e Parerga e Paralipomena (1851) trouxe- lhe o tão desejado reconhecimento, mas ele não viveu o suficiente para usufruir dele, pois morreu nove anos depois, no dia 21 de setembro de 1860, solitário como viveu.
Fonte: www.filosofia.uol.com.br

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