Filosofia Circular

domingo, 3 de agosto de 2014

Vota em Mim


Não somos otários. Somos espertos. Eleição é uma jogada e o povinho é burro e tirano em sua burrice. E nós queremos o poder. E o povinho não pode ser contrariado. Por isso a gente dá sempre o que ele quer, nunca mais, nunca menos. Se o povinho quer funk a gente não vai fazer concerto de música clássica.  Se o povinho quer futebol, a gente não contraria, a gente arma o circo. Não é que sejamos uns filhos da puta, é que não somos otários, entende? Conhecemos o povinho. E vou te dizer, compadre, o povinho é foda. Eles querem comprar eletrodoméstico, querem ter celular caro, tênis de marca. Eles não querem estudar. Vamos falar a verdade, só estamos eu você aqui, estudar é chato, estudar é um troço a longo prazo, e o povinho quer agora, já. E se eu não der o que o povinho quer, vem outro e dá e ganha o povinho. E nós, do meu partido, não somos otários. Otário dá dura no povinho em ano de eleição. Manda andar de ônibus, economizar água, não jogar lixo na rua, trabalhar em dia de jogo. Otário total. O povinho chia. O povinho fica puto. E vai correndo atrás de outro que balance uma nota de cem, um Iphone 18S, uma Ferrari, consumo agora, já, morfina na veia. Você vê? O povinho me colocou, eu e o meu partido nessa arapuca. Pra mudar eu preciso estar no poder e pra estar no poder eu preciso continuar fazendo o mesmo. Discurso, compadre, o povinho só fala. Elite, classe C, tanto faz. O cara quer mudar sem abrir mão de nada. E você quer que o otário aqui dê uma de herói e fale umas verdades pro povinho no horário eleitoral gratuito? Há! O povinho não quer pai em ano de eleição, ele quer mãe, ele quer teta. E a culpa agora é minha? Meio século de esbórnia, de putaria, de beijar a mão de coronel pra ganhar um lugar melhor na Casa Grande e agora a porra da culpa é minha? Sabe o que eu acho? Eu acho que a gente é farinha do mesmo saco, e no fundo a gente se entende, se reconhece. Eu e você, cara. Você também vê o seu lado, procura um jeitinho de se dar bem hoje, aqui agora. Uma bolinha de papel amassada e jogada na rua? Você cata, compadre? Você procura uma lixeira pra jogar? Não é problema seu, certo? E você não é otário de ficar catando lixo dos outros. Se entupir a porra do bueiro é culpa do povinho, do governo, não sua. Nós somos vítimas, nós dois. Então olha o meu lado que eu olho o seu, da sua empresa, da sua família, da sua igreja. Uma mão lava a outra, por isso todo mundo tem a mão limpa nesse país. Então, quando eu estiver falando lá na TV ou em cima do palanque, me entenda, me redima, e vota em mim.
Texto extraído do blog: http://senhoritasafo.blogspot.com.br/
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